A batalha dos consoles começa na UD

No dia 13 de abril de 1983,  o jornal Folha de São Paulo, publicou uma matéria sobre a guerra dos consoles que iriam ser apresentados na lendária Feira de Utilidades Domésticas, a UD que aconteceria no dia seguinte… Veja qual era a expectativa…

 

Batalha de fabricantes na Feira de Utilidades

João Clodomiro do Carmo
Folha de São Paulo

Amanhã, quando os portões da Feira de Utilidades Domésticas — UD — se abrirem, estará também começando uma surda batalha entre dois gigantes da eletrônica. Philips e Gradiente vão disputar palmo a palmo as simpatias dos consumidores, principalmente para dois produtos: o toca-discos a laser e os videogames. Nos Videojogos a batalha vai-se chamar “Atari versus Odyssey”. A Philips alugou a maior área disponível para montar o seu “stand”: 1.200 m2, bem no centro do pavilhão de exposições. Shows com raios laser, demonstrações do novo sistema usando o disco com músicas brasileiras, um computador respondendo perguntas e finalmente os jogos eletrônicos “Odyssey”, que começam a ser comercializados em junho. O objetivo será mesmo o de impressionar os visitantes do “stand”, preparando o terreno para o começo da fabricação dos toca-discos a laser, ainda sem data definida.

A Gradiente terá uma presença mais modesta na UD. mas no terreno prático tem os mesmos trunfos que a Philips: além de estar desenvolvendo o projeto do toca-discos a laser para os primeiros meses de 1984, a empresa acaba de assinar um contrato com a Atari, e será o fabricante exclusivo dos videojogos dessa marca no Brasil.

Maurício Ardilti, diretor-superintendente do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento do Grupo Gradiente, diz que a tecnologia dos videojogos Atari é reconhecida no mundo inteiro. e sua penetração no Brasil terá ainda a vantagem de ser fabricada pela Gradiente, reconhecida pelos consumidores de equipamentos de som. “A Atari já comercializou cerca de 11 milhões de consoles só nos Estados Unidos, o tem mais de 60 títulos de jogos disponíveis. Enquanto isso, o Odyssey, lançado peia Philips, vendeu menos de 1 milhão de unidades e não tem jogos tão interessantes quanto os Atari”, afirma.

UM COMPUTADOR
Os videojogos Atari foram lançados nos Estados Unidos em 1977. Num pequeno console estão instaladas placas de circuitos integrados ligados a um ou mais comandos. Um cartucho, com um programa de computador é introduzido no console, e o jogo está pronto para começar. Há diversos níveis de dificuldades e o jogo pode ser realizado entre a pessoa e a máquina, entre duas pessoas ou num campeonato. com diversas duplas participando. As modalidades dc jogos disponíveis nos programas sâo infinitas: desde o nosso popularíssimo futebol, até batalhas espaciais, aventuras nas selvas e coisas parecidas. Tudo com imagens coloridas c sons que acompanham cada ação dos heróis ou vilões envolvidos no jogo.

No Brasil, a Gradiente espera que a recepção seja semelhante à dos Estados Unidos, e está preparando suas linhas de montagem em Manaus para fabricar cerca de 100 mil unidades ainda cm 1983. e outras 200 mil no ano que vem.

O console brasileiro custará o dobro do preço atualmente cobrado nos Estados Unidos: Cr$ 160 mil. E os cartuchos com os programas serão vendidos ao consumidor por cerca de Cr$ 18 mil. Os componentes serão quase todos nacionalizados, exceto os chips onde estão os circuitos integrados de larga escala, ainda não fabricados no Brasil.

EFEITOS PSICOLÓGICOS
Os executivos da Gradiente acham que os videojogos são uma evolução natural dos antigos jogos de cartas, praticados por toda a família quando se reuniam informalmente no passado. E acham que sua popularidade se deve ao falo de que as pessoas estão cada vez mais confinadas às suas casas. “Não são os videojogos, ou qualquer outra nova tecnologia que atraem as pessoas para dentro de casa”, argumenta Arditti. Segundo ele, há fatores outros, anteriores à eletrônica, empurrando as pessoas para fora do convívio social. “Antigamente, dispunha-se de espaço para brincadeiras ao ar livre e, nos fins-de-semana, as famílias reunidas costumavam ir às praias ou ao campo. Essas coisas estão se tornando cada vez mais difíceis. É por isso que os jogos eletrônicos fazem sucesso. Eles tomam o confinamento mais prazeroso”. diz Arditti.

Ele recusa a ideia de que os videojogos poderiam causar angústia suicida em crianças, como alguns psicólogos têm argumentado, citando como exemplo o Japão. “O que acontece no Japão é que as crianças são fortemente pressionadas a estudarem muito para o vestibular da escola primária. Ê essa angústia que às vezes causou suicídio de crianças de até oito anos de idade. Os videojogos são muito pouco populares no Japão”, explica. Arditti reconhece que os videojogos não resolvem os problemas de espaço e de contato com a natureza, mas amenizam o confinamento das crianças dentro de casa. “As crianças não ficam quietas, querem sempre estar fazendo algo. Os videojogos são uma alternativa oferecida pela eletrônica. Mas não representam nenhuma solução para os problemas reais do contato com a natureza.”

CONFRONTO
A batalha para suprir o mercado brasileiro com videojogos não se vai dar apenas entre a Philips e a Gradiente, comercializando marcas diferentes. A Dynacon também será afetada pelo acordo entre a Atari e a Gradiente, já que essa empresa tem fornecido cartuchos com a marca Atari a diversos lojistas, mas sem pagar royalties à empresa americana. A Gradiente diz que não causará problemas à Dynacon, mas exigirá o cumprimento de algumas normas: A Dynacon não poderá usar o logotipo Atari, mas poderá afirmar que seus jogos são utilizáveis em consoles Atari. “Isso é muito comum nos Estados Unidos. Há diversos fabricantes de jogos, oferecendo cerca de 200 diferentes títulos aos consumidores”, conclui Arditti.